“Todos vêem tua aparência. Poucos sabem quem tu és”. A frase é de Maquiavél, pai das Ciências Políticas. Gosto dela e das inúmeras reflexões que ela nos propõe. Costumo, aos sábados, pedir o almoço de um mesmo restaurante. Almoço lá, peço para retirada, peço para entrega. Nem preciso me identificar. Pelo pedido, a atendente já sabe que sou eu. No sábado quando cheguei (como de costume) ela me cumprimentou muito simpática. “Sabia que você vinha. Coloquei uma cervejinha lá embaixo do freezer”, disse sorridente. Ela conhece bem minhas preferências. Há mais de dez anos frequento o local. “Se não tiver gelada, você não paga”, reforça.
Chego lá com minhas camisetas velhas, bermuda e chinelo. Na espera, a cerveja gelada – previamente separada – adorna a conversa sempre agradável. “Toda noite assisto você na TV. Na reprise, que é quando chegamos em casa. Comento com meu marido, ele assim no jornal todo sério nem parece aquele cliente que chega lá. Sempre tão simples”. Essa relação de cordialidade é antiga. Me sinto muito à vontade com minha interlocutora para tratar de todos os assuntos. Comércio, insegurança, filhos, saúde, televisão, pratos variados (inclusive ela incluiu um no cardápio a meu pedido – fiquei todo envaidecido). A refeição sempre saborosa, por vezes ganha um tempero a mais pelo afeto e atenção dispensados. Registre-se, essa gentileza é de praxe com toda a clientela.
O propósito dessa divagação toda é destacar a chance singular de permitir ser acessado por alguém. Pessoas que nos enxergam além do que a aparência entrega. Exercitar isso exige sensibilidade e desprendimento. Somos induzidos à julgar de imediato. Somos seres visuais e precipitados. Que possamos refletir sobre isso. Pensar como Exupery e considerar que o essencial é invisível aos olhos. Compartilho versos de um tempo passado mas que ilustram um pouco a coluna de hoje.
Não sou eu na TV
Não sou eu o que vê̂
Esse terno é miragem
A gravata é bravata
Do que sou pra você̂._
A imagem não mostra
Não traz a verdade
A nossa vontade
A insanidade_
Quem te julga não sabe
O caminho que fez
A vitória ou derrota
A cilada da vez_
Um recorte da vida
É o que cabe na tela
A essência da alma
Voou na janela._
Boa semana.
@moises@tcm10.com.br