Como o eleitor vai entender um pedido de apoio político nessa fase do processo eleitoral? Será que pode ser um pedido de financiamento nesse novo estilo de vaquinha virtual?
Com todo respeito a quem pensa em contrário, conhecendo a realidade de nossas eleições, tendo atuado nos últimos vinte anos e quatro anos como Juiz Eleitoral, além de ter experiência pessoal na política, através de meu genitor, o eleitor brasileiro verá, no pedido de apoio político, o que ele realmente tem para o candidato, o seu voto.
E talvez a única possibilidade formal de contato com o eleitor, nesse momento prévio, além do encontro em local aberto com a sociedade, às expensas do partido político já comentado, que não seja diretamente nessa linha e ao mesmo tempo diz respeito à novidade de que somente a pessoa física pode doar para as campanhas, tendo havido regulamentação expressa na lei e resolução como veremos no texto seguinte, trata-se de compreender o pedido de apoio político como pedido para que financie a campanha do pré-candidato. Contudo, se a pessoa vai ajudar no financiamento da campanha é porque acredita na mesma e, por conseguinte, vai votar. Essa abertura para nós é bem factível da mudança operada desde a lei 13.165/2015 e que agora realmente se intensifica.
Ou será possível alguém financiar a campanha de um candidato e votar em outro?
Em tese não deveria ser, porque quem apoia financeiramente uma campanha tem interesse direto que a mesma tenha êxito e, na maioria esmagadora das vezes, investe verdadeiramente com o intuito de ter um retorno, quando do eventual exercício do mandato. Não se tem perspectivas de que as pessoas físicas sejam diferentes das pessoas jurídicas, logo, apesar de teoricamente haver uma relação direta, na prática, ainda teremos aquelas pessoas que apoiarão umas e votarão em outras, tamanha a deturpação de nossa política ( https://joseherval.jusbrasil.com.br/artigos/232858877/doacao-de-campanha-investimento-com-retorno-garantido ).
Entretanto, acompanhando o que deve acontecer na maioria dos casos, pensamos que esse pedido de apoio deve ser restrito a divulgação das propostas e plataformas partidárias e para tanto, após expostas nos diversos encontros que a legislação permite nesse momento prévio, possam os dirigentes e até mesmo pré-candidatos entrar em contato com os demais partidários, a fim de que as alianças sejam acertadas e não se permitir nessa via o contato com o eleitorado, que como visto, nos textos anteriores, é muito restrito, apesar da abertura feita pelo legislador e ampliada para se puder receber dinheiro da pessoa física pelo financiamento coletivo através da internet.
Pensar diferente do que está sendo proposto é deturpar o sistema e isso é inadmissível, já que a autorização de exaltação das qualidades pessoais e pedido de apoio devem no máximo procurar viabilizar pré-candidatos que, a partir das discussões, possam defender que estão preparados para serem escolhidos na convenção e não antecipar a campanha com o corpo a corpo com os eleitores, em especial, nesse momento de pandemia, dai porque, acertadamente, o STF, ratificou inclusive a decisão da Presidente do TSE sobre a desnecessidade de no momento se adiar as eleições, pois o calendário eleitoral se encontra em dia, ressalvando, evidentemente, que em momento oportuno pela própria evolução da pandemia, se não for possível o contato dos futuros candidatos, quando depois de efetivamente registrados, aí sim teremos o prejuízo, sem sombra de dúvidas, contudo essa decisão não é da Justiça Eleitoral pela Constituição Federal e sim do Congresso Nacional. STF mantém prazo para filiação partidária e desincompatibilização nas eleições municipais de 2020. O adiamento das eleições municipais 2020: um debate necessário.
E o que estamos vendo hoje na prática?
Os pré-candidatos fazendo visitas diárias aos eleitores e lançando em eventos públicos os seus projetos políticos individuais e, mais uma vez, o partido político, ficando de lado. Na realidade, é muito perceptível a força que os partidos receberam, ainda mais com a lei 13.165/2015, todavia, tal força cede para os interesses das pessoas que procuram exercer mandatos e, por conseguinte, quando chegam ao poder, este é exercido também de forma pessoal.
É um círculo vicioso e pernicioso em que os interesses coletivos sempre cedem para os interesses pessoais.
Não temos a menor dúvida que a maioria dos problemas que envolvem a nossa sociedade estão ligados a essa triste peculiaridade, que corrói nosso sistema, ao ponto do mesmo estar em colapso e que somente uma verdadeira reforma de todo o referido sistema, mexendo no que chamamos de estrutura do poder pelo poder (Os males da corrupção eleitoral para a sociedade).
Por fim, mencionamos nesse décimo texto, o parágrafo terceiro, trazendo uma proibição específica para os profissionais da rádio e televisão, senão vejamos:
Art. 36-A (Lei das Eleições)
§ 2º Nas hipóteses dos incisos I a VI do caput, são permitidos o pedido de apoio político e a divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver.
§ 3º O disposto no § 2º não se aplica aos profissionais de comunicação social no exercício da profissão.
Ou seja, além da restrição de ter que sair bem antes de sua efetiva escolha em convenção, como aconteceu pela primeira vez nas eleições de 2016, o profissional do meio de comunicação não poderá utilizar-se da estrutura do veículo de comunicação em que trabalha para pedir apoio político ou divulgar sua pré-candidatura, sob pena de incidir em abuso de poder midiático.
E porque será que para esses profissionais as restrições são bem maiores que os demais?
Não tenho a menor dúvida em afirmar que tal vedação reside na certeza de que o abuso de poder midiático é o mais eficaz em termos eleitoreiros. Em outras palavras, quem de alguma forma se utiliza de rádio e televisão para fazer propaganda, fora do que é permitido, parte na frente em relação aos demais candidatos, desigualando ainda mais o já desigual processo eleitoral e obtendo um potencial eleitoreiro muito grande.
Acresça-se, ainda, que se não houvesse a vedação, teríamos o contato direto do pré-candidato com milhares de pessoas diretamente e subvertendo o sistema, de modo que na pré-campanha poderia ser feito tudo, que só seria permitido na campanha, o que é totalmente desarazoável.
Portanto, o que estamos defendendo desde o primeiro texto dessa nossa série é que não haja atos de campanha nessa fase e comprovamos que o único inciso que permite esse contato antecipado com o eleitorado, tem um viés coletivo, sendo vedado, no nosso sentir, a individualização, que só será permitida a partir do dia 16 de agosto e teoricamente, a partir das premissas fixadas pelo partido/coligação na qual o candidato faz parte, de modo que o sistema feche como se diz. No penúltimo texto em que comentaremos o financiamento coletivo, o contato apesar de ser individual, tem as suas peculiaridades, já que o eleitor que diretamente resolve doar, na realidade se envolve na própria campanha.
E se não for assim, repetimos a indagação que restou implícita em todos os textos e explícita agora, o pré-candidato tem o mesmo direito de efetivo candidato com relação a atos de campanha? Ou tem até mais?
A resposta deve ser dada por cada um, a partir dos critérios objetivos, fixados pelo legislador e que o nosso TSE – por mais que existam dificuldades para a definição da tese jurídica de cada caso de propaganda irregular nessa fase anterior – possa, o mais rápido possível estabelecer a diretriz a ser seguida, trazendo segurança jurídica a todos, pois hoje, talvez, seja o que mais esteja faltando ao nosso processo eleitoral no sentido mais amplo do termo.
Em que pese algumas decisões já indicarem a linha dos nossos textos, precisamos aclarar de uma vez por todas, já que a redação da lei e da própria resolução ainda deixam dúvidas, contudo, sinceramente, não pode haver transferência de responsabilidade para o Judiciário, bastando que o legislador, por exemplo, permita claramente que se faça propaganda antes do efetivo pedido de registro após a convenção e todos os problemas serão resolvidos, aí se indaga porque não fez?