Não há um centímetro de Brasil que não tenha sangue e suor negro na construção das igrejas, prédios antigos e nas estruturas sociais que sustentam o país. No documentário AmarElo: É tudo pra ontem, Emicida escolheu o Theatro Municipal de São Paulo como forma de ocupar espaços, celebrar e isolar o preconceito.
Para o rapper, foi uma forma de celebrar aqueles que sempre estiveram longe dos lugares de protagonismo, pois eram destinados às senzalas e porões. Hoje, nada mudou, mas continuam resistindo e traçando narrativas dignas de estarem nos livros de História – como os verdadeiros heróis de uma pátria.
Aprofundado nas raízes raciais, no dia 20 de novembro, o Brasil reflete sobre o Dia da Consciência Negra. A escolha da data remete a morte de Zumbi dos Palmares, no ano de 1695. O líder quilombola que lutou contra a escravidão colonial e travou lutas para libertar os descendentes de escravizados nas terras brasis é uma figura importante na luta e igualdade racial.
A data foi estabelecida pelo projeto Lei n.º 10.639, no dia 9 de janeiro de 2003. No entanto, somente em 2011 a lei foi sancionada (Lei 12.519/2011) pela então presidente Dilma Rousseff.
Sendo um convite à reflexão sobre a importância da valorização da cultura afro-brasileira e um chamado para combater o racismo estrutural que persiste em nossa sociedade. O caminho percorrido por negros e negras é oposto, marcado por preconceito, índices de discriminação e estatísticas que apontam mortes em decorrência do racismo e “balas perdidas” que encontram corpos negros e subalternos.
Conhecendo narrativa de protagonismo negro
Em 1980, o Rio Grande do Norte ganhou, como estreia no teatro, uma das mais belas atrizes. Voz potente, olhar profundo e com sede de tornar o teatro algo plural. Assim, Tony Silva conquista os palcos e torna-se admirada por muitos.
“Durante 10 anos eu achava que tudo isso era uma brincadeira – ser atriz. Mas, de repente, eu entendi que ser atriz era participar, doar e cobrar também as nossas políticas públicas”, diz
E foi aos poucos que a atriz começou a entender a importância do teatro e a questão social e de visibilidade que ele poderia lhe proporcionar. As personagens e a arte presente na sua essência foram fundamentais para perceber que Tony Silva tinha se firmado como atriz.
Porém, como mulher negra, foi preciso enfrentar as barreiras do preconceito. A artista descreve que as dificuldades são inúmeras.
“É difícil entender que uma mulher negra é inteligente para uma sociedade embranquecida. É difícil entender que a mulher negra pode estar onde ela quiser e da forma que ela quiser”, comenta.
Tony Silva afirma que uma das maiores dificuldades é dizer que a comunidade negra existe e que a sociedade precisa respeitar os direitos fundamentais que foram roubados juntos com a identidade afro-brasileira. “Que tenham respeito e que nos seja dado tudo que é direito neste país. As dívidas têm que ser cobradas”, frisa.
Para ela, afirmar-se como negra simboliza a presença da cor e da negritude na sociedade, é “assumir todos os meus ancestrais e jeitos, maneira e forma de viver. Isso é lutar para se entender como mulher negra”.
Perguntada sobre o que ela diria para meninos e meninas negras, a artista mossoroense é firme na resposta:
“As dificuldades continuam, mas a gente está aqui tentando abrir os caminhos para amenizar e eles tomarem o bastão da luta. Levando à frente toda a sua negritude, exigindo respeito, tendo a responsabilidade, cobrando o que foi nos tirado. Isso é importante e que venham para a luta. Faz-se necessária a sua presença”, expressa.
Das influências da cultura ao orgulho
Da capoeira ao samba, do candomblé à culinária, a influência negra está presente em cada traço da cultura brasileira. Do “dengo” ao “cafuné”, à saudação “axé”, estamos conectados por palavras, expressões e características diversas. Contudo, é preciso trilhar caminhos que tenham respeito e amor à comunidade negra, preservando as raízes ancestrais presentes.
Você já se perguntou: quantos amigos negros eu tenho? Ou: quais artistas negros eu ouço? Ou então: como posso contribuir para a luta antirracista?
Se questionar sobre hábitos, ações e formas de combater o racismo e pensar sobre questões raciais se fazem presentes como uma maneira de perpetuar talentos e trazer narrativas de diversidade negra. Separamos para você artistas pretos para você acompanhar o ano inteiro, não somente em datas como esta.
Veja os artistas negros:
Luedji Luna
Baiana de Salvador, Luedji Luna é puro talento! Se aventura na música como compositora, cantora de MPB, jazz e soul. Suas canções abordam questões raciais, feminilidade, empoderamento feminino tendo como recorte a mulher negra. Entre as músicas mais conhecidas estão: Asas e Banho de Folhas, além de uma discografia extensa.
Liniker
Mulher negra e trans, Liniker tem potência, voz única e talento marcante. A artista vem quebrando paradigmas e trazendo a representatividade LGBT+ ao cenário musical.
É considerada uma figura importante por quebrar estereótipos e pelo ativismo que traz assuntos relacionados à diversidade e inclusão.
As músicas da cantora abordam amor, afeto e traz mulheres trans como protagonistas de suas histórias. Recentemente, a artista foi considerada imortal pela Academia Brasileira de Cultura.
Alcione
Quem nunca ouviu “A loba”, “Meu Ébano” ou “Você me vira a cabeça”? Alcione dispensa apresentações.
Conhecida carinhosamente como Marrom, a cantora, compositora e multi-instrumentista coleciona uma carreira de respeito! Ao longo de sua trajetória musical já lançou mais de 30 álbuns de estúdio e nove produções ao vivo.
Severo Ricardo
De Olho D’água dos Borges aos palcos do Nordeste. Severo Ricardo é cantor, compositor e sanfoneiro. O artista potiguar tem orgulho de ser negro, nordestino e forrozeiro.
“A gente tem a cultura negra e nordestina efetivada no forró. Nos meus shows eu levanto essas duas bandeiras “, disse o cantor ao Jornalismo TCM.
Antonio Francisco
Considerado o rei do cordel no Brasil, Antonio Francisco tinha que ser potiguar de Mossoró. Ocupa a cadeira número 15 na Academia Brasileira de Literatura de Cordel (ABLC), tendo como patrono o poeta cearense Patativa do Assaré. Tem tanto poesia na ponta da língua e nos livros que fica difícil de contar. Mas, vamos ao mais conhecido: Dez cordéis num cordel só (2001).
Tony Silva
Atriz desde 1980, os palcos são pequenos para o talento que Tony Silva carrega. Fez mais de 70 espetáculos em companhias que já participou e 30 recitais. Ver Tony atuando é como sentir que liberdade e resistência são marcas da atriz.
Alice Carvalho
Atriz, roteirista, escritora e dramaturga, a natalense Alice Carvalho protagonizou cenas dignas de Oscar na série Cangaço Novo, da Amazon Prime Video. Interpretando a vivíssima Dinorah, ela levou o sangue potiguar e orgulho de ser comedor de camarão.
O Dia da Consciência Negra é político e social. Refletir a data é pensar situações de racismo que negros enfrentam diariamente e opressões que se tornaram comuns e naturalizadas. É incômodo ao ver que negros estão sendo mortos pela violência policial e que crianças negras ainda convivem diante de um sistema de opressão.
Dessa maneira, é preciso desnaturalizar o preconceito e analisar nossas atitudes. É um exercício diário.
Com informações dos sites: Toda Matéria e PUCRS.
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