Uma das ferramentas mais importantes para a fiscalização do poder público no Brasil completou 10 anos. A Lei de Acesso à Informação, chamada LAI, garante ao cidadão o acesso a qualquer documento ou informação produzida pelo Estado. Desde que não tenha caráter pessoal ou não esteja protegida por sigilo. Ela tem papel fundamental no combate à corrupção e na fiscalização de órgãos públicos. Mas a implantação desta lei tem encontrado dificuldades.
Em Mossoró, o portal da transparência da Prefeitura Municipal revela um número preocupante: de 70 solicitações de informação até julho, apenas 29 foram respondidas. Isso representa 36%, quase um em cada três pedidos.
A Lei de Acesso à Informação prevê, por exemplo, que os órgãos públicos forneçam imediatamente as informações solicitadas pelo cidadão – mas dá um prazo máximo de 20 dias caso seja necessário processar ou compilar algum dado. A média de tempo das respostas da Prefeitura é de 19 dias.
Trabalho dificultado
Além de pedidos negados, ou demora em responder, há também os casos de omissão – quando as demandas são solenemente ignoradas. Isso acontece com jornalistas, porém mais grave é quando isso acontece com um fiscalizador eleito.
Na Câmara Municipal de Mossoró os pedidos de informação além de serem feitos formalmente (por requerimento ou de forma oral) devem ser votados no plenário. Uma formalização que não faz mais sentido após a Lei de Acesso à Informação – que garante que qualquer pessoa possa ter acesso à informação pública.
Mas aí você pode imaginar que os pedidos feitos por vereadores sejam mais eficientes: se engana. Nós usamos justamente a Lei de Acesso à Informação para saber da Prefeitura e da Câmara Municipal quantos pedidos já foram feitos e respondidos.
Segundo a resposta ao pedido de e-SIC 074/2022 para a Prefeitura de Mossoró, apenas um pedido de Lei de Acesso foi respondido nos últimos dois anos. Um pedido feito pelo presidente da Câmara Municipal, Lawrence Amorim. O pedido do parlamentar foi feito no dia 8 de abril, e respondido no dia 14 do mesmo mês.
Números não batem
Fizemos o mesmo pedido à Câmara Municipal de Mossoró – que mostra a falta de controle da ouvidoria do município. A Câmara respondeu que foram feitos nesta legislatura 205 pedidos de informação (117 de maneira oral e 88 através de requerimentos).
Em 2021, segundo a Câmara Municipal, de 89 apenas 18 pedidos de informação foram respondidos à secretaria legislativa. Isso significa que apenas 20% tiveram resposta.
Em 2022, a reposta ao nosso pedido de Lei de Acesso, revelou que de 116 pedidos 12 tiveram resposta – um percentual de 10,3% de retorno.
Oposição é mais ignorada
O gabinete do vereador Francisco Carlos alega ter feito 20 pedidos. O parlamentar de oposição teve dois pedidos rejeitados no plenário, mesmo ele tendo direito fundamental a informação. Apesar do levantamento da secretaria legislativa apontar três respostas aos pedidos do vereador, o gabinete alega apenas um foi realmente respondido.
Segundo o levantamento da Câmara Municipal, o vereador Francisco Carlos tem 35 pedidos de informação em aberto. O segundo no ranking dos mais ignorados é o líder do governo, vereador Genilson Alves com 25 pedidos em aberto.
O mandato do vereador Pablo Aires diz que fez 25 requerimentos de informação em 2021, e apenas sete foram respondidos: 28%. O levantamento da câmara mostra que ele tem 21 pedidos em aberto. O cabo Tony tem 20 pedidos esperando resposta.
Entre os pedidos não respondidos estão coisas simples como quais são as empresas terceirizadas que prestam serviço ao município, como está a situação do saneamento básico da cidade ou sobre o andamento sobre a revisão do Plano Diretor da cidade.
Qual a importância?
A legislação permite pedidos para todas as esferas (municipal, estadual e federal) e todos os Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário). Em algumas circunstâncias específicas, também organizações e até empresas privadas são obrigadas a responder às dúvidas dos cidadãos.
O pesquisador canadense Gregory Michener, do Massachusetts Institute of Technology é uma referência quando o assunto é Lei de Acesso. “[A lei no Brasil] enfrentou percalços”. Ele critica a ausência de “sanções e supervisão suficientes”. Ele destaca que a lei funciona mais em nível federal do que municipal.
UMA LEI PARA TODOS
Engana-se quem acha que a LAI é uma ferramenta de uso exclusivo da imprensa. É um recurso disponível para qualquer pessoa. Tanto que mais de 1 milhão de pedidos de informação já foram feitos para o governo federal.
EMBATE COM A LGPD
O obstáculo do momento para a LAI é a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), aprovada em 2018 e que entrou em vigor em 2020. Algumas negativas a pedidos de informação passaram a mencionar a nova legislação, citando um suposto conflito entre publicidade e privacidade. A situação causou insegurança jurídica para servidores encarregados de responder aos pedidos de informação.
Há divergências sobre o assunto, mas os defensores da LAI alegam que a LGPD não é uma regra de privacidade, e sim uma política que estabelece quais os procedimentos devem ser tomados para a guarda e compartilhamento de dados pessoais. A LAI tem um dispositivo para a proteção de informações pessoais, que serve como forma de ter acesso parcial a um documento público.