Costumo dormir cedo. Aos domingos mais cedo ainda. Nove da noite já estou nos primeiros cochilos antes de me entregar ao sono. Mas ontem, especificamente, não consegui adormecer como habitualmente. Depois de me esbaldar com episódios da série “Em Casa com os Gil” (um mergulho na arte, poesia, música, amor, relações familiares) assistia ao programa Fantástico e fui de um extremo a outro. Uma reportagem sobre famílias que enfrentam desafios para alimentar os filhos me comoveu. Na verdade, me fez chorar sem parar por alguns minutos. Me coloquei no lugar daqueles pais e mães que tentavam de tudo para colocar comida na mesa. Deixavam de fazer refeições para que as crianças se alimentassem. Catavam legumes no lixo para uma sopa. Contavam com a merenda no colégio da rede pública para que os filhos não ficassem sem comer.
Entrevistada na reportagem, a mãe de três crianças deu o seguinte depoimento: “vou dormir com fome, mas feliz porque sei que meus filhos se alimentaram na escola”. Aquela mãe, sem emprego, sem nada na geladeira, sem recursos para o básico me chamou muito a atenção. Além da tristeza que me causou a situação ali relatada, ela ficou em evidência para mim, enquanto telespectador, pela maneira sempre sorridente, otimista e grata com que falava. Agradecia aos vizinhos, aos pequenos comerciantes, aos bons corações que partilhavam o pouco com aquela família. Lembrei de imediato do filme “La Dolci Vita” (1960). Um clássico do cinema que, apesar de um sessentão, é extremamente atual. Como no filme com o personagem de Mastroianni, ela encontrava forças no amor para proteger aquelas crianças do peso dos dias.
A partir dos primeiros depoimentos colhidos pelo repórter Estevan Muniz comecei a me emocionar. Algumas lágrimas deitaram no meu rosto e antes do fim do conteúdo eu estava chorando copiosamente. Me atingiu enquanto pai, enquanto profissional, enquanto ser humano, enquanto alguém privilegiado. Há algo de muito errado nos tempos em que vivemos enquanto humanidade. Tanta riqueza nesse mundo e por outro lado tanta miséria. Fome. Pobreza. Injustiça.
Penso que minha maneira de contribuir para que isso mude é também escrevendo. Acredito que faço pouco ainda pelos outros. Essa reportagem serviu-me de alerta para não baixar a guarda e procurar ser mais empático e solidário enquanto pessoa. Se não puder doar uma feira, doe uma cesta. Se não puder doar uma cesta, doe alguns quilos de itens básicos. Se não puder doar itens básicos, doe uma porção de alimento. Se não puder doar uma porção de alimento, doe alguns minutos de atenção. Há muita gente precisando de quase tudo nesse mundo que não falta quase nada.
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