Nos negócios, a hora não é de terra firme. Muitos acreditam que a grande oportunidade para o desenvolvimento do Rio Grande do Norte vem novamente do mar. A relação com o nosso litoral foi fundamental para o surgimento da capital, sustenta nosso turismo de praia e mar quentinho, e abriga importantes atividades econômicas: pesca, sal e petróleo.
Isso explica o olhar atento de investidores e governos internacionais para o potencial energético do Rio Grande do Norte. Por aqui, empresas já entenderam o tamanho da oportunidade e tentam se posicionar para o que promete ser um divisor de águas para o desenvolvimento da região.
Está em jogo diversos interesses, um deles é o acordo de Paris, que prevê avanços globais na questão do controle da emissão de carbono. E se a energia eólica já é uma realidade que mudou a paisagem de diversas cidades potiguares, o foco agora é o potencial de gerarmos energia eólica offshore – ou seja em alto mar.
Agora não há outro caminho senão se aventurar pelo oceano atlântico. E a primeira atitude par navegar em mares desconhecidos é entender a dinâmica do negócio e estar preparado para as demandas que vão surgir.
Umas das primeiras expedições para o futuro da energia eólica offshore foi de inciativa da Federação das Indústrias do Rio Grande do Norte (FIERN) e do SENAI-RN. As instituições organizaram a primeira missão internacional para entender as oportunidades de negócio para a efetivação dos parques eólicos offshore.
Aprender com os pioneiros
A missão da Fiern teve como destino o Reino Unido – a região é líder na produção de energia eólica offshore na Europa. Ao todo 20 empresas e instituições fizeram parte da comitiva potiguar – algumas que já se dedicam a geração de energia renovável em diversos ramos como construção civil, montagem de torres eólicas, telecomunicações e consultoria em meio ambiente.
No final do ano passado, o Reino Unido inaugurou o maior parque eólico offshore do planeta, o Hornsea 2. Agora o país tem os dois maiores parques eólicos com produção no mar do mundo.
Um relatório de 2022 da RenewableUK mostra que a geração eólica offshore global total atingiu 517 GW. A China tem atualmente a maior capacidade totalmente operacional, mas o Reino Unido, que é o segundo em capacidade instalada, tem um horizonte (projetos em desenvolvimento e em licenciamento) de 86 GW.
Oportunidades para empresas potiguares
A viagem está sendo encarada com muito entusiasmo pelas empresas potiguares escaladas para a missão internacional no Reino Unido. O CEO da Dois A Engenharia e Tecnologia, e atual presidente do Sinduscon, Sérgio Azevedo está focado em gerar relação.
O administrador de uma das empresas potiguares mais importantes na construção de parques de energia eólica em terra, Sérgio acredita em resultados no médio prazo. “[Será] uma oportunidade para as empresas aqui do Estado, e também uma oportunidade para as empresas internacionais, que podem encontrar nas empresas locais um parceiro estratégico. Um sócio cultural, que pode ajudá-los a explorar as oportunidades com uma empresa que conhece toda a complexidade logística, tributária e fiscal que temos no Brasil. Entendo que não serão investimentos imediatos, mas que podem acontecer, desde que tenha apoio e incentivo do governo federal e estadual. Tudo a médio prazo”.
Nosso patamar e potencial
Para os especialistas no setor, o negócio nem pode mais ser considerado embrionário visto o interesse no nosso potencial. “Não estamos engatinhando, hoje o nível de maturidade deste negócio é inicial, mas não é engatinhando. Temos diversos pedidos de licença para que o negócio saia do papel”, afirma Rodrigo Mello diretor do SENAI-RN e do Instituto SENAI de Inovação em Energias Renováveis.
Hoje há no país, a intensificação de estudos em relação aos processos de licenciamento para instalação dos primeiros complexos eólicos no mar. Cerca de 80 empreendimentos previstos para a costa estão, atualmente, à espera de licenciamento no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). A maior parte da potência está concentrada no Nordeste.
Recentemente, a gigante do petróleo Shell anunciou que deu entrada em março com pedidos de licenciamento ambiental junto ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais (IBAMA) para geração de energia eólica offshore em seis estados, incluindo o Rio Grande do Norte.
Os projetos em desenvolvimento, juntos, terão capacidade instalada de 17GW. A nota ainda afirma que “com mais de 20 anos de atuação em energia eólica no mundo e mais de 50 anos de tradição em projetos offshore, a Shell pretende aliar sua expertise nestas duas frentes com o objetivo de fornecer mais energia e energia limpa para o país”.
O anúncio da Shell foi feito em inglês como uma demonstração de investimento em energias limpas. É importante destacar isso, por que os investimentos em energia renováveis está na “moda”. E pode gerar um grande volume de ‘financiamento verde’ – como é chamado os investimentos em sustentabilidade.
Velha conhecida
Outra grande empresa petrolífera que anunciou estudos na área de energia eólica offshore no estado foi a Petrobras. Em anúncio em março deste ano, a companhia disse ter assinado parceria para avaliar a viabilidade técnico-econômica e ambiental de sete projetos de geração de energia eólica offshore, com potencial de até 14,5 GW.
A Petrobras que durante mais de uma década foi a principal geradora de riquezas do estado, sendo responsável por grande parte do Produto Interno Bruto do Estado entre as décadas de 1970 e 1980.
Entre os estudos da Petrobras em energia eólica está o que pode ser o parque Colibri, que fica na fronteira litorânea entre o Rio Grande do Norte e Ceará. A nota ainda afirma que o objetivo da empresa é neutralizar as emissões da companhia até 2050. “No nosso Plano Estratégico para o período de 2023 a 2027, a eólica offshore é um dos segmentos priorizados para estudos aprofundados”, afirma o comunicado.
O SENAI do Rio Grande do Norte e a Petrobras discutiram na terça-feira (25), o andamento de projetos de Pesquisa, Desenvolvimento & Inovação (PD&I) conjuntos, além de potenciais cooperações em energias renováveis.
Na ocasião, o diretor do Instituto SENAI de Inovação em Energias Renováveis, Rodrigo Mello, destacou que Petrobras e Senai andam juntas. “Nós temos com a Petrobras um longo histórico de relacionamento e o que estamos discutindo hoje são novas fronteiras a serem desbravadas. [] É um momento que encaramos como oportunidade de parte a parte para otimizar tempo e gerar as respostas. Enxergamos essa discussão, sem dúvida, como oportunidade para a pesquisa aplicada no Brasil voltada à transição energética e às energias renováveis”.
Precisamos de Norte
O presidente do Sistema FIERN, Amaro Sales de Araújo, o momento é de fazer estas hélices girarem o vento a nosso favor. “O Estado também tem um potencial para geração offshore de 54,5 Gigawatts. Estamos falando no equivalente ao abastecimento de cerca de ⅓ de toda energia elétrica brasileira em 2020”, disse Amaro quando o anúncio da missão de empresários para o Reino Unido.
O interesse é grande, por causa do potencial de geração e energia envolvido. “O potencial de geração dessa energia de cerca de 700 GW, sugere um potencial de investimento gigantesco” reforça Rodrigo Mello.
Até o início do ano, o Rio Grande do Norte tinha nove projetos com pedido de licença em análise. Somados seriam 17,8 GW, sendo os maiores, com capacidade de gerar 3 GW. Caso aprovados e aplicados como nos projetos, serão mais de 1.200 aerogeradores. O maior parque prevê 215 turbinas.
Industria 4.0 e tecnologia
A energia eólica produzida no mar atende dois grandes motores das novas industrias: preocupação ambiental e inovação (tecnologia). Um exemplo disso é a parceria entre Petrobras e SENAI do Rio Grande do Norte que resultou no projeto BRAVO. Hoje, o litoral do estado está sendo monitorado em formato experimental pela Boia Remota de Avaliação de Ventos Offshore (Bravo).
O Instituto Senai de Inovação (ISI) pode ter com este projeto uma tecnologia inédita no país. Ela será capaz de reduzir o custo de monitorar os ventos numa determinada região no mar para futuras instalações de parques. Hoje este é um custo caro para quem pretender construir um parque.
A boia BRAVO tem um sistema que capta dados meteorológicos de forma automatizada. Dados como velocidade e a direção dos ventos marítimos. Informações essenciais para o estudo de potencial energético de turbinas eólicas no mar.
“Diversas multinacionais do setor de energia têm demonstrado interesse em explorar nosso potencial eólico offshore. O projeto da Bravo proporcionará a nacionalização de uma tecnologia usada no mapeamento dos recursos eólicos marítimos. Não existe, no momento, um fornecedor local com equipamento próprio validado para essa aplicação”, a declaração foi dada na apresentação de uma revista científica, pelo engenheiro mecânico Antônio Medeiros, coordenador de pesquisa e desenvolvimento do ISI em Energias Renováveis, sediado em Natal (RN).
Para saber a regularidade e força dos ventos numa determinada região no mar, muitas empresas instalam bases fixas, o que deixa o processo muito caro. A pequena boia com DNA potiguar surge como uma tecnologia que soluciona diversos problemas num “mergulho só”.
O primeiro modelo da Bravo começou a ser testado no fim do ano passado. A boia foi lançada no litoral da cidade de Areia Branca/RN. Os testes devem durar até junho. Ai os dados coletados pela Bravo durante o período serão comparados a um outro sensor fixo.
A Petrobras já estimou que o equipamento pode gerar uma redução de 40% no custo da medição eólica offshore em relação a outros prestadores do mesmo serviço. “A Bravo poderá contribuir para o aumento da oferta dos serviços e redução do custo de implantação dos projetos de eólica offshore no país”, informou a Petrobras.
Objetivos da viagem
O objetivo da viagem ao Reino Unido é conferir a operação de parques eólicos offshore – instalados no mar – e prospectar oportunidades de negócios para o Estado.
“Há muitas oportunidades para micro e pequenas empresas, e essa missão tem a lógica de levar empresas do segmento para encontrar as empresas do Reino Unido, que já estão operando nesta cadeia, para que daqui a quatro, cinco anos não tenhamos na implantação dos parques offshore brasileiros apenas fornecedores de fora”, disse Rodrigo Mello.
Numa reunião de preparação da missão da Fiern, Amaro Sales, defendeu a visão de que as oportunidades são muitas, mas hoje a luta da Federação é criar boas condições para o negócio. “Temos que continuar a luta por segurança jurídica, pelo fortalecimento das empresas, pela construção de um porto para atender a essa nova indústria”, explicou ele.
Um novo porto ‘verde’
A construção de um ‘porto indústria’ no Rio Grande do Norte é uma unanimidade para quem estuda o futuro da energia. É que só com uma nova estrutura será possível a produção do novo combustível o hidrogênio verde.
O governo do estado tem apresentado ao projeto do novo porto a investidores com experiência no negócio. Esta semana, a cônsul-geral da Noruega no Brasil, Marianne Fosland, foi apresentada a proposta. Segundo o governo do estado, o projeto Porto Indústria Verde está avançado e é prioridade.
O projeto também conta com o interesse de empresas chinesas. Após viagem de uma comitiva potiguar a China, o projeto do Porto-Indústria Verde do Rio Grande do Norte, interessou a empresa CCCC, que oficializou o pedido de acesso ao estudo de viabilidade e detalhes do processo. A empresa informou que enviará técnicos ao estado em maio.
A China que é um gigante das energias renováveis. Segundo o Global Energy Monitor, nos últimos anos, a China foi responsável por cerca de metade do crescimento global em energia renovável. De acordo com documentos oficiais, a China lançará mais capacidade eólica e solar a cada ano até 2030 do que a Alemanha tem atualmente no total.
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