Por Alexandre Fonseca
Mossoró é conhecida como uma cidade de forte cultura no Rio Grande do Norte. Ao longo dos anos, conseguiu consolidar eventos específicos, que se tornaram o cartão postal do município, com ações que fomentam diversas artes, principalmente, na época junina, no entanto, quando o assunto é produção audiovisual, o caminho está sendo pavimentado.
A cena audiovisual mossoroense, seja profissional, independente ou desenvolvida por meio de recursos municipais, estaduais ou federais, é discutida em ambientes acadêmicos e fora deles, por décadas. A tentativa dos professores, produtores, sempre esteve direcionada para a criação de uma Mossoró que fabrica longas e curtas de qualidade, embora o volume desse tipo de produto, não tenha alcançado o ideal, até o momento. Não que seja preciso ter um número ideal. Arte pode existir sem limites, correto?! A verdade é que, atualmente, estamos presenciando uma mudança no setor.
Festivais de Cinema em Mossoró
É interessante, antes de tudo, recapitular algumas iniciativas que ajudaram a construir um caminho de protagonismo para as produções audiovisuais locais, como, por exemplo, mostras de filmes digitais e presenciais. O tipo de ação cultural que representa uma vitrine direta para o fortalecimento da mensagem que reverbera uma cena existente em Mossoró. Vamos elencar a seguir, atividades mais recentes, não pioneiras, porém, igualmente importantes na pavimentação já mencionada no início da reportagem.
Festival Quarentene-se, realizado em 2020, de forma virtual. | Imagens: Divulgação.
Em setembro de 2020, durante a pandemia da Covid-19, nascia o Festival Quarentene-se, um projeto da diretora e fotógrafa, Wigna Ribeiro e apoiado pelo Sebrae/RN. Oficinais gratuitas, exibição de filmes de forma remota e premiações com troféus, fizeram parte da programação. “A ideia surgiu no auge da pandemia, quando os projetos culturais estavam sendo feitos todos virtualmente. O maior desafio foi fazer um festival sem a experiência. Conversei com outros realizadores, pra montar uma boa curadoria. Teve um fomento e conseguimos pagar o cachê dos oficineiros, os troféus… Alguns que ganharam o festival, hoje, trabalham de fato com audiovisual”, conta Ribeiro.
Equipe do FACIM 2024. | Imagens: Divulgação.
Em novembro de 2021, pela coordenação do diretor Plínio Sá e da jornalista Luiza Gurgel, o Festival Alternativo de Cinema de Mossoró, o FACIM, ganhava a sua primeira edição. Mais de 600 filmes de gêneros variados, foram inscritos. Em 2023 e 2024, a segunda e terceira edição, aconteceram respectivamente com mudanças estruturais, apresentações artísticas, além das oficinas e exibições de filmes. Durante os anos, o festival foi promovido com apoios alternados da Fundação José Augusto, Lei Aldir Blanc, Sebrae/RN e Lei Paulo Gustavo.
“Em 2019, Mossoró estava sem nenhum festival de cinema, não tinha onde exibir nossos filmes, então, pensei em incentivar a produção audiovisual local, em formar público, ter oficinas, alternando com outras linguagens culturais. A nossa primeira edição foi interrompida pela pandemia, na semana do festival, tudo fechou! Daí surgiu um edital, o FACIM foi aprovado e levamos cinema para a periferia e praças de Mossoró. O festival significa valor e incentivo as produções audiovisuais locais”, diz Sá.
Fest Curta Mossoró, realizado em 2022. | Imagens: Divulgação.
Já em março de 2022, era idealizado pelo jornalista Jean Custo, o Fest Curta Mossoró. Um festival viabilizado no Teatro Municipal Lauro Monte Filho, antigo Cine Cid, cinema inaugurado na década de 60. A mostra teve apoio da Fundação José Augusto e da Lei Aldir Blanc. “O Fest Curta Mossoró foi criado da vontade de promover um espaço que celebrasse e fomentasse a produção audiovisual local. Produzir um festival envolve muitos desafios, desde a captação de recursos, passando pela construção das parcerias, de ter uma programação valorizando os produtores… Foi realizado graças ao patrocínio da Lei Aldir Blanc e ao apoio de instituições. E representa até hoje, o fortalecimento da cena audiovisual potiguar”, pontua Custo.
Leis de incentivo à cultura
Talvez a cena audiovisual de Mossoró não seja maior, pelos obstáculos. Fazer cinema é complicado! Para uma produção vingar, é necessário ter uma equipe alinhada, ferramentas para captação de áudio e vídeo eficazes, uma série de outras demandas que só podem ser resolvidas com dinheiro e muito empenho. O audiovisual independente que ainda sobrevive, respira, sem exagero, pelo suporte das leis de incentivo.
A cada festival descrito nos parágrafos anteriores, deve ter notado que citamos a cooperação de entidades e auxílios, que apesar de modestos, em determinadas situações, garantem um aparato financeiro crucial, para os produtores audiovisuais. Lei Aldir Blanc, Lei Maurício de Oliveira, Lei Paulo Gustavo, são só três delas, apontadas como colaboradoras na extensão de filmes e eventos multimídias.
Logos oficiais das leis de incetivo à cultura. | Imagens: Divulgação.
“Os maiores desafios hoje, estão relacionados aos recursos. Pra fazer um festival de médio porte, precisa de toda uma estrutura, para projeção dos filmes, atendimento ao público, acessibilidade, para trazer os realizadores dos filmes”, conta o professor Esdras Marchezan, que está diretamente ligado a promoção de uma mostra audiovisual, que abordaremos adiante.
Ações culturais diversas
Além dos festivais, pequenas ações podem ter um impacto significativo na cena audiovisual de Mossoró. As mostras geradas em espaços reduzidos ou propriamente culturais, fazem a diferença no contexto das produções que não foram selecionadas para os eventos maiores. E que, emancipadas dos mesmos, podem ser acompanhadas sem as grandes estruturas. As iniciativas mais intimistas, também contribuem na construção desse caminho.
Os jornalistas Emanuela de Sousa e Alexandre Fonseca, apresentando a Mostra de Documentários do Projeto Vida. | Imagens: Divulgação.
Em setembro de 2021, acontecia no Teatro Municipal Dix-Huit Rosado, a Mostra de Documentários do Projeto Vida. Três histórias (Primeiro Passo, Bigode Taekwondo e Um Sinal para o Futuro) eram contadas pelos refletores do retroprojetor, na lona estendida em frente ao palco.
1° CINE – O Lugar Importa, mostra audiovisual desenvolvida no curso de RTVI, da Uern. | Imagem: Divulgação.
Em outubro de 2024, o auditório do Sesc/RN abriu as portas para a exibição dos filmes Ruínas do Campo de Albert Souza, Lugares Fantasmas de Erick Medeiros e Tantico – Além da Visão de Lígia Xavier & Joicielisson Gomes. O 1° CINE – O Lugar Importa, idealizado pela professora Kalyne Almeida, foi uma das muitas mostras que já passaram por lá e um movimento que floresceu nas salas de aula da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, no curso de Rádio, TV e Internet, evidenciando a importância do viés acadêmico na edificação de uma nova conjuntura audiovisual mossoroense.
“Quando a gente fala de uma cena cultural, musical, do cinema, elas são caracterizadas por altos e baixos. Mesmo que esteja aparentemente consolidada, sempre haverá dentro do meio, quem coloque contrapontos apontando suas fraquezas. Acredito sim, que exista uma cena cultural do audiovisual, que está sendo protagonizada por pessoas que fazem parte dela. Uma cena que possui uma contribuição direta dos cursos de Comunicação da Uern”, expõe o professor Tobias Queiroz.
“O curso de Rádio, TV e Internet, tem ajudado a tecer o enredo, que a gente visualiza como uma cena cultural. Temos alguns nomes que capitaneiam esses movimentos. A Universidade é um ponto-chave no desenvolvimento do audiovisual da cidade, é nela que temos o aperfeiçoamento de técnicas, fornecimento de mão de obra, pessoas que vão trabalhar com outros elementos, como figurinos, maquiagem… Tudo isso compõe o audiovisual”, completa.
Alcar Nordeste 2024. | Imagens: Divulgação.
No mês vigente, na metade de novembro, a Uern sediou a 8ª edição do Alcar Nordeste, um encontro regional entre profissionais que pesquisam a história da mídia e dentro do evento, a Mostra Audiovisual Ivonete de Paula, exibiu filmes de alunos e ex-alunos da Universidade.
“Coletivamente, nós da organização pensamos que seria muito oportuno, colocarmos uma pequena mostra audiovisual, de trabalhos recentes que demarcassem essa efusividade na produção do curso de RTVI. Homenageamos uma jornalista, atriz, produtora cultural, uma mulher bastante influente no seu tempo, um nome histórico que é a Ivonete de Paula”, relata Daiany Dantas, professora e organizadora da ação.
“O primeiro impacto é na formação de plateia, é importante que a gente se veja na tela. Os filmes são feitos com poucos recursos, temos muitas dificuldades estruturais, mas, esses recursos têm sido cruciais. Temos aprimorado o ponto de vista técnico, acadêmico e as pessoas que pesquisam impactos, dizem que produção local e mostras, resultam numa maior visibilidade. O fato de dentro da Universidade erguermos uma bandeira e mostramos que estamos aqui, já tem um impacto político e social.”, finaliza.
“Os alunos de RTVI produzem muito! E muita coisa boa! Usam a criatividade, com uma força comunitária e realizam grandes obras. Por mais que hoje muito conteúdo sobre produção audiovisual seja encontrado na internet, é diferente você se aprofundar, ter, além da formação técnica, uma formação crítica sobre Comunicação, alcance econômico, social e cultural. A formação acadêmica é indispensável. A meu ver, Mossoró tem um potencial imenso para se tornar um dos grandes polos de produção audiovisual nacional. Talentos e ‘recursos humanos’ de alta qualidade, já existem de sobra”, afirma o professor Artur Marques.
Sessão do CineBaixinha, que acontece na Praça da Televisão. | Imagens: Divulgação.
Ainda podemos citar como exemplo, locais de ações afirmativas criados a céu aberto, como é o caso do Ponto de Cultura Baixinha Berço das Artes. O projeto promove sessões de filmes com o CineBaixinha, em praça pública. “Como em nosso Ponto de Cultura são desenvolvidas muitas atividades, de variados segmentos, apresentamos o CineBaixinha uma vez por mês, sempre numa terça-feira, na Praça da Televisão. O crescente interesse da comunidade em busca do cinema, em assistir, debater, dizer que gostou mais do filme anterior, do que o atual, já é um grande impacto. É uma maneira de fortalecer a memória da comunidade”, evidencia Dionízio do Apodi, coordenador do lugar e integrante do Grupo de Teatro O Pessoal do Tarará.
O que reserva o futuro
Nos dias 19, 20 e 21 de novembro, Mossoró vai sediar a segunda edição da Mostra Audiovisual do Semiárido, o CINE ÁRIDO, evento aprovado pela Lei Paulo Gustavo e realizado com apoio da Fundação José Augusto e do Sesc/RN. Na programação divulgada, rodas de conversa, oficinas formativas e diálogos culturais. O primeiro ano do festival aconteceu em março de 2023, oriundo de uma disciplina do curso de Jornalismo da Uern.
2º CINE ÁRIDO. | Imagem: Divulgação.
O CINE ÁRIDO emergiu a partir de um projeto de extensão criado por Marchezan, chamado Vozes do Semiárido, com o intuito de gerar uma referência na produtividade de conteúdo jornalístico e audiovisual sobre a região. “É uma janela de exibição para idealizadores brasileiros do semiárido. A primeira edição seria presencial, porém, diante de alguns ataques criminosos no Estado, no período, a Universidade esteve fechada e nós fizemos online. A segunda edição vai ser de forma presencial, com vários convidados”, explicou.
“Enquanto diretor-geral, estou aprendendo muito! Não atuava nesse campo. Estou contando com uma equipe experiente, alguns alunos de Comunicação. Para essa edição, o CINE ÁRIDO vai prestar uma homenagem à atriz Tony Silva, com uma mostra específica, com filmes em que ela participou. Que a mostra possa somar ao cenário de festivais do Rio Grande do Norte! Mossoró é a capital do semiárido e queremos formular uma provocação política de que a cidade pode ser um centro de produção audiovisual no país”, completa.
O futuro também reserva, provavelmente para o primeiro semestre de 2025, a segunda edição do Quarentene-se. Agora apoiado pela Lei Paulo Gustavo, o evento deixará o âmbito virtual e será realizado de forma presencial. Titulado: Festival Quarentene-se 2: Fora de Casa. Apuramos com exclusividade, que o Fest Curta Mossoró terá novas edições. Maiores detalhes, serão revelados em breve. Já o FACIM, chegará ao seu quarto ano!
O que está esperando? É hora de começar a desenvolver os roteiros, montar as equipes e produzir. A cena audiovisual de Mossoró existe, talvez só esteja precisando da sua produção. “O que realmente move os realizadores é mostrar sua obra, tocar os outros, fazer a maior quantidade de pessoas sentirem, pensarem e o festival tem um papel fundamental nisso”, reflete Marques. Nessa linha de raciocínio, é preciso aproveitar cada oportunidade de exposição. Vamos produzir!
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