Aos 75 anos de idade, Dom Mariano Manzana dá início ao fim do seu bispado em Mossoró/RN após 18 anos. Atencioso e determinado, Dom Mariano se dedicou à fortalecer a Diocese de Santa Luzia, e com isso, conquistou o apreço e carinho dos fiéis. O que a grande maiores deles não sabe, é que ao longo desses anos, o Bispo cultivou não só a fé cristã, mas um verdadeiro jardim no quintal de casa.
Assim como toda criança, Mariano Manzana cresceu observando os afazeres dos pais. Foi na pequena Mori na Itália, na década de 40, que ele aprendeu a sua grande missão de vida, evangelizar, e também seu principal hobby, plantar. Enquanto caminha pelo quintal quase que todo sombreado pelas árvores, Dom Mariano conta que aprendeu ainda menino com o pai, a fazer o plantio.
“Meu pai era agricultor, eu aprendi desde criança a cuidar de plantas, amar os animais, amar as plantas, amar a criação. E isso ficou dentro de mim. Quando cheguei aqui como bispo, encontrei a beleza desse quintal imenso, por isso plantei e me sinto muito a vontade no quintal”, disse Dom Mariano.
No início, a agricultura era um meio de sustento para ajudar a família. Até que em 1973, Mariano trocou a roça pela igreja, e deu início a sua trajetória presbiteral, ainda na Itália. Ele passava tanto tempo se dedicando ao cultivo, que quando sua ordenação aconteceu, os próprios moradores da cidade se perguntavam quem seria o novo padre.
“Quando eu fui nomeado padre, perguntaram:” Quem é esse filho de Luigi que nunca ninguém viu? Porque um é engenheiro, outro é gerente de supermercado, outro trabalha no banco e o outro trabalha na roça. Qual é o filho que vai ser padre?”, era o da roça!!”, relembra Dom Mariano.
SEMEANDO EM NOVAS TERRAS
Quis o destino que Mariano deixasse não só a vida de agricultor, mas também a vida na Itália. Em 1977 chegou na Diocese de Mossoró como missionário, e em 1993 assumiu a Paróquia do Sagrado Coração de Jesus em Umarizal/RN. Nem a diferença da língua, nem a diferença do clima, foram capazes de impedir o Bispo de continuar a plantar. Ainda na Paróquia de Umarizal, ele voltou a cultivar algumas mudas. Mas foi só quando assumiu a Diocese de Mossoró, em 2004, ele começou a construir seu próprio jardim.
A paisagem ao redor da casa construída em 1942 mudou completamente nos últimos 18 anos. A arquitetura antiga ganhou ainda mais vida quando os tons de verde tomaram conta do espaço. As palmeiras que se destacam na entrada da casa, começaram a ser plantadas em 2006. Sorridente enquanto caminha entre elas, Dom Mariano conta que as duas primeiras mudas das palmeiras foram compradas em uma feirinha, em frente a Catedral de Santa Luzia, e custaram R$ 15. Essas foram responsáveis por dezenas de outras mudas.
Todas as plantas que cresceram e continuam crescendo no jardim foram plantadas e cuidadas pacientemente por Dom Mariano. Caminhar pelo jardim dá a sensação de estar em um lugar a parte da cidade: além da beleza da paisagem verde e florida, a temperatura é amena, bem diferente da que os mossoroenses estão acostumados. Com toda a arborização, o respirar lá é mais leve e prazeroso.
Entre as flores, rosas do deserto e vincas ajudam a colorir o espaço. Com o passar dos anos, o cultivo cresceu e além da sombra, o quintal começou a dar frutos. Manga, acerola, laranja, limão e caju aos montes. Sorte dos seminaristas que moram ao lado, que acabam ganhando as frutas do vizinho. Engenhoso, todo o cuidado com as plantas é feito exclusivamente por ele. Aos 75 anos e cheio de disposição, Dom Mariano faz o próprio adubo, e montou sozinho, um sistema de irrigação que percorre e rega todo o jardim.
Assim como a leitura e o jogo de xadrez, cultivar as plantas é um momento de lazer para o Bispo. Todos os dias ele separa ao menos 2 horas para se dedicar ao quintal. Rapidamente troca a batina por uma bermuda, camisa de manga longa e boné para se proteger do sol e botas para pisar no chão de barro, bem diferente do que os fiéis estão acostumados a ver dentro da igreja.
O jardim acabou se tornando o refúgio de Dom Mariano. É lá, sozinho, cuidando de seu plantio e ouvindo o som do vento batendo nas folhas, onde ele encontra paz e equilíbrio.
“Para mim o quintal é uma higiene mental. Eu sempre aprendi desde do seminário, que é bom ter uma alternativa ao trabalho para descansar a cabeça, para descansar o corpo, porque o nosso é um trabalho também muito intelectual […] O Quintal para mim nesses anos, sobretudo nesses dezoito anos de bispo, foi um pouco como cano de escape. Aqui as vezes passam as dificuldades, se descansa. As vezes sai da cabeça, limpa”, diz Mariano Manzana.
E AS PRÓXIMAS SEMENTES?
Para Dom Mariano, a arte de semear lhe ensina sobre a vida. Levou seu bispado nos últimos 18 anos do mesmo jeito que cuidou do jardim: cultivando seus frutos com paciência. “Tem que esperar que nasça. Tem que esperar que cresça. Tem esperar que dê fruto. Isso ajuda a entender ainda melhor os processos humanos. Tem que ter tempo de espera. Um momento é de semear, outro momento de crescer, outro momento de aguar. Também chegará o tempo em que se pode colher […] Aprendi aqui no quintal, trabalhando com as plantas, que tem que ter tempo de esperar, tempo de cuidar, tempo de deixar crescer”, diz o Bispo.
Em breve Dom Mariano deixa seu cargo e passa a missão para o novo bispo de dar continuidade ao seu trabalho. Na carta de renúncia enviada ao Papo Francisco no dia de hoje, Mariano ressaltou um de seus principais feitos: ter contribuído para o crescimento do seminário e ajudado a ordenar mais de 50 padres para a Diocese.
Ao deixar o posto de bispo, Dom Mariano deixa também a casa e o jardim. Quando perguntado sobre quem vai cuidar do quintal daqui para a frente, Mariano sorri e de forma amável responde que independentemente do novo líder gostar ou não de cultivar, ele confia que as sementes que plantou, vão continuar a germinar.
Confira na íntegra a leitura da carta de renúncia de Dom Mariano enviada ao Papa Francisco:
Nos próximos meses, o bispo agricultor vai ter a oportunidade de conhecer e cultivar novas terras. A maior dúvida de todos é sobre qual será o destino de Dom Mariano daqui para frente, se vai permanecer em Mossoró, ou se voltará para a Itália. Por enquanto, o então bispo ainda não disse quais são seus planos futuros. De um jeito carinhoso, como de costume, ele responde: “O tempo… O futuro… estão realmente nas mãos de Deus”.
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